Faça uma reflexão rápida: quantas vezes ouviu ou disse que “o Brasil é uma terra sem lei”? Muitas, não é? A primeira justificativa que vem à mente é a impunidade
institucionalizada no país, que não leva (ou não mantém) à cadeia vândalos, corruptos e estelionatários, entre outros criminosos.
Agora, faça uma reflexão mais profunda e perceba que isto ocorre não pela falta de leis. Nosso código penal, por exemplo, prevê prisão a todos estes delitos. Não é, portanto, a ausência legal que leva alguém a roubar e matar mesmo diante da vítima indefesa, um filho a agredir um pai ou um pai a assassinar o filho.
No ano passado, consternados pela tragédia de Santa Maria, especialistas logo alertaram que as leis existiam, mas que, como acontece muito no país, a segurança foi preterida em razão do lucro. Mais uma vez, se o local exibia lotação muito acima da sua capacidade, não foi por falta de leis.
Como mais este exemplo, chega-se ao ponto central da questão: no Brasil, sobram leis, mas faltam valores. Aqui, leis são criadas para disciplinar o óbvio, para dizer que as pessoas são legalmente proibidas de fazer algo que a moral já deveria ser suficiente para impedi-las.
É como a nova regra em Porto Alegre que pune quem joga lixo no chão. Foi preciso criar uma lei para convencer pelo bolso a não se comportar como desleixados - para usar adjetivo menos ofensivo. Jogar lixo no chão é um ato primitivo, uma involução.
É o retrocesso da humanidade que leva os legisladores a criarem regras para dizer que as pessoas não podem beber e dirigir, matar ou roubar ou serem corruptas. Quantas pessoas “não estão nem aí” para os R$ 127,69 de multa ao dirigirem acima da velocidade? E por que se preocupariam, se é “troco” para elas? Alguém pode alegar o risco de ter a carteira cassada e o direito de dirigir suspenso, pois é o que a lei prevê. Ótimo, se não fosse mais uma lei inócua. Recentemente, foi preso no Estado um condutor que dirigiu bêbado pela terceira vez em dois anos. Ou seja, contrariou a lei, foi reincidente e nada acontece.
É mais uma prova de que isto se resolve com valores, não com leis.
Na Câmara e no Senado, tramitam incontáveis projetos para estabelecer novas leis. Os idosos são um dos assuntos preferidos desde que pesquisas atestaram o aumento da expectativa de vida. Isso não é necessariamente ruim. O ruim é imaginar que novas leis surgirão, aumentando o emaranhado legal no qual o Brasil se embretou e que todos estes retalhos jamais formarão colcha alguma.
A solução, como sempre, passa pela educação e muitas décadas serão necessárias até que sejamos uma sociedade evoluída. Mas, se não começarmos de uma vez, este dia pode nunca chegar.